O Benefício de Prestação Continuada, conhecido como BPC/LOAS, é um direito importante no Brasil para pessoas com deficiência e idosos em situação de vulnerabilidade. Mas nem todas as deficiências são tratadas da mesma forma quando o assunto é conseguir esse auxílio. Para quem tem autismo, o processo pode ser um pouco diferente – e às vezes mais complicado – do que para pessoas com deficiências físicas, por exemplo. Neste artigo, vamos explicar de forma simples o que é o BPC, como o autismo é visto nesse contexto e por que o tratamento pode variar. Usaremos exemplos do cotidiano para tornar tudo mais claro, especialmente para quem não está acostumado com o “juridiquês”.
O que é o BPC/LOAS e como ele funciona?
O BPC/LOAS é um benefício previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (Lei nº 8.742/1993). Ele garante um salário mínimo por mês a idosos acima de 65 anos ou pessoas com deficiência que não conseguem se sustentar sozinhas ou com a ajuda da família. Para ter direito, é preciso provar duas coisas: que a renda por pessoa na família é menor que ¼ do salário mínimo (embora haja exceções) e, no caso da deficiência, que ela impede a participação plena na sociedade, como trabalhar ou viver de forma independente.
Pense na Ana, uma mulher de 30 anos que perdeu a visão e não consegue mais trabalhar como costureira. Ela pede o BPC e o INSS analisa se a cegueira dela realmente a impede de ganhar a vida. Agora, imagine o João, um jovem de 22 anos com autismo. Ele até entende algumas coisas, mas não consegue lidar com mudanças na rotina ou conversar com desconhecidos, o que torna um emprego impossível. Nos dois casos, o objetivo do BPC é o mesmo: ajudar quem não pode se virar sozinho. Mas o jeito de provar isso muda dependendo da deficiência.
Autismo é uma deficiência? Como a lei enxerga o TEA?
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é reconhecido como uma deficiência no Brasil desde a Lei nº 13.146/2015, chamada Estatuto da Pessoa com Deficiência. Isso significa que pessoas com autismo têm os mesmos direitos que alguém com uma deficiência física ou intelectual. Mas o autismo é diferente porque não é algo que dá para “ver” com os olhos, como uma perna amputada ou uma cadeira de rodas. Ele afeta a forma como a pessoa pensa, se comunica e interage com o mundo.
Por exemplo, a Clara, de 10 anos, tem autismo leve. Ela fala, mas não entende brincadeiras e fica ansiosa em lugares barulhentos. Já o Pedro, de 15 anos, tem autismo severo e não fala, precisando de alguém para ajudá-lo a comer e se vestir. Os dois têm deficiência, mas o impacto na vida deles é diferente. Para o BPC, o INSS precisa entender como o autismo de cada um limita a participação na sociedade – e isso nem sempre é fácil de avaliar.
O que diferencia o autismo de outras deficiências no BPC?
No BPC, todas as deficiências têm o mesmo objetivo: provar que a pessoa não consegue viver plenamente sem ajuda. Mas o tipo de deficiência muda a forma como o INSS faz essa análise. Deficiências físicas ou sensoriais, como paralisia ou surdez, são mais visíveis e fáceis de medir com exames médicos. Já o autismo é uma condição neurológica, e os sintomas variam muito de pessoa para pessoa. Isso faz com que o processo para autistas dependa mais de documentos detalhados e da interpretação do perito.
Imagine o Luiz, que perdeu uma perna em um acidente. Na perícia do INSS, o médico vê a prótese e entende que ele não pode mais trabalhar como pedreiro. O caso é claro. Agora pense na Mariana, de 18 anos, com autismo moderado. Ela anda, fala um pouco, mas não suporta barulho e entra em crise em ambientes cheios. O médico do INSS não “vê” o autismo dela como vê a perna do Luiz. Ele precisa de um laudo explicando como o transtorno a impede de ter uma vida comum. Essa diferença torna o caminho dos autistas mais subjetivo e, às vezes, mais difícil.
A importância da perícia médica para autistas
Quando alguém pede o BPC, o INSS faz duas avaliações: a perícia médica e a avaliação social. Na perícia, um médico analisa a deficiência, enquanto na avaliação social um assistente social verifica a renda e as condições de vida. Para quem tem uma deficiência física, a perícia costuma ser rápida: o médico olha um exame ou observa a pessoa e decide. Para autistas, a coisa muda de figura. O médico precisa entender o comportamento, as limitações sociais e até o histórico da pessoa, o que exige um bom laudo médico.
Vamos comparar dois casos. O Roberto, de 40 anos, é cadeirante por causa de uma lesão na coluna. Na perícia, o médico do INSS confirmou a deficiência em 10 minutos, porque era evidente. Já a Sofia, de 25 anos, tem autismo leve. Na perícia, ela parecia “normal” porque estava calma naquele dia, mas o laudo mostrava que ela não conseguia trabalhar por causa da ansiedade extrema. Sem o laudo, o médico poderia achar que ela não precisava do BPC. Isso mostra como a perícia para autistas depende de provas bem apresentadas.
Por que o laudo médico é mais crucial para autistas?
O laudo médico é essencial para qualquer deficiência no BPC, mas para o autismo ele é ainda mais importante. Como o transtorno não aparece em um exame de sangue ou raio-X, o laudo precisa descrever como o autismo afeta a vida da pessoa. Ele deve ser feito por um especialista (como psiquiatra ou neurologista), incluir o código CID-11 (6A02 para TEA) e detalhar os sintomas e limitações, como dificuldade de comunicação ou dependência para tarefas básicas.
Por exemplo, o Thiago, de 12 anos, tem autismo severo. O laudo dele diz que ele não fala, tem crises de agressividade e precisa de cuidados 24 horas por dia. Isso deixa claro para o INSS que ele não pode viver sozinho. Já a Laura, de 30 anos, tem autismo leve e levou um laudo vago, dizendo apenas “paciente com TEA”. O INSS negou o pedido porque não entendeu como o autismo a limitava. Um laudo detalhado faz toda a diferença para autistas, mais do que para outras deficiências.
A renda familiar e as exceções: Autismo muda algo?
Para receber o BPC, a renda por pessoa na família deve ser inferior a ¼ do salário mínimo (cerca de R$ 353 em 2025). Mas a Justiça e o INSS aceitam flexibilizar esse limite se a pessoa tem gastos altos com saúde, como terapias ou remédios. Isso vale para qualquer deficiência, mas os autistas podem se beneficiar mais dessa exceção, já que tratamentos como fonoaudiologia, psicologia e medicamentos são comuns no TEA.
Imagine a família do Gabriel, de 8 anos, com autismo severo. A renda deles é um pouco acima do limite, mas eles gastam R$ 500 por mês com terapias. Com recibos e o laudo, o INSS aceitou o pedido. Já o Marcos, que é cego, não tem esses gastos porque usa serviços gratuitos do SUS. O autismo, por exigir mais cuidados contínuos, pode abrir essa brecha na renda com mais frequência.
Os desafios extras para famílias de autistas
Conseguir o BPC para uma pessoa com autismo traz desafios que outras deficiências nem sempre enfrentam. Primeiro, o diagnóstico pode demorar, especialmente no SUS, onde faltam especialistas. Segundo, os peritos do INSS nem sempre entendem o autismo, achando que “se a pessoa anda e fala, está bem”. Terceiro, as famílias precisam reunir mais provas, como relatórios de terapias, para reforçar o laudo.
A história da Carla, mãe do Eduardo, de 14 anos, mostra isso. Ela esperou um ano por um psiquiatra no SUS para o laudo. Na perícia, o médico disse que o Eduardo “parecia normal” porque ele ficou quieto na sala. Só depois de levar relatórios da escola e da psicóloga, mostrando as crises dele, o BPC foi aprovado. Para uma deficiência física, esse esforço extra muitas vezes não é necessário.
O papel da Justiça no tratamento dos autistas
Se o INSS nega o BPC, a pessoa pode recorrer à Justiça. Para autistas, isso é mais comum, porque o INSS às vezes subestima o impacto do transtorno. Na Justiça, um juiz analisa o laudo, ouve testemunhas e decide se o benefício deve ser concedido. Um bom advogado e documentos sólidos podem fazer o pedido virar um “sim”.
O caso do Rafael, de 20 anos, é um exemplo. Ele tem autismo moderado e o INSS negou o BPC, dizendo que ele poderia trabalhar. Na Justiça, o laudo mostrou que ele nunca conseguiu um emprego por causa da dificuldade de interação. O juiz mandou o INSS pagar. Para deficiências mais visíveis, essas batalhas judiciais são menos frequentes.
Perguntas e Respostas
1. O autismo é tratado como deficiência leve pelo INSS?
Não necessariamente. Depende do laudo e de como o autismo afeta a pessoa. Autismo leve pode ser aceito se provar limitações reais.
2. Preciso de laudo mesmo se o autismo é óbvio?
Sim, o INSS exige o laudo formal, não aceita só o relato da família.
3. O BPC para autistas é mais difícil de conseguir?
Pode ser, porque o autismo é menos visível e exige mais provas do que deficiências físicas.
4. Posso pedir o BPC sem renda baixa se tenho gastos com terapias?
Sim, mas precisa provar esses gastos com recibos e justificar no pedido.
5. Quanto tempo leva para aprovar o BPC de um autista?
Varia, mas costuma levar de 3 a 6 meses no INSS. Na Justiça, pode demorar mais.
Conclusão
O BPC/LOAS é um direito valioso para pessoas com deficiência, mas os autistas enfrentam um caminho diferente – e muitas vezes mais longo – do que quem tem deficiências físicas ou sensoriais. A necessidade de um laudo detalhado, a subjetividade da perícia e os custos extras com tratamentos fazem do processo algo único para o TEA. Ainda assim, com as provas certas e, se necessário, o apoio da Justiça, o benefício pode ser conquistado. Entender essas diferenças é o primeiro passo para garantir que pessoas com autismo tenham o suporte que merecem. Se você está nessa jornada, busque ajuda especializada e não desista: o BPC pode fazer toda a diferença na vida de quem precisa.