Autistas têm direito a vaga de estacionamento especial? Entenda as leis

A garantia de acessibilidade é um pilar fundamental para a inclusão de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) na sociedade. Dentre as diversas medidas que visam promover essa acessibilidade, o direito a vagas de estacionamento especiais é um ponto crucial, muitas vezes desconhecido ou mal compreendido. Este artigo, sob uma perspectiva jurídica, detalha o arcabouço legal que assegura esse direito aos autistas, explicando os requisitos e a forma de obtê-lo.

O reconhecimento do autista como pessoa com deficiência

A base legal para o direito de autistas a vagas de estacionamento especiais reside na Lei nº 12.764/2012, conhecida como Lei Berenice Piana. Este diploma legal foi um divisor de águas ao reconhecer o autista como pessoa com deficiência para todos os efeitos legais. Essa equiparação é de suma importância, pois automaticamente estende às pessoas com TEA todas as prerrogativas e benefícios previstos na legislação brasileira para pessoas com deficiência, incluindo aquelas relacionadas à acessibilidade e ao uso de vagas de estacionamento.

A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), o Estatuto da Pessoa com Deficiência, veio a consolidar e detalhar esses direitos, reforçando a obrigação do poder público e da iniciativa privada em promover a acessibilidade em todos os seus aspectos, o que naturalmente abrange as áreas de estacionamento.

A previsão legal das vagas especiais

O direito a vagas de estacionamento especiais para pessoas com deficiência é garantido principalmente por normas de trânsito e legislação específica de acessibilidade. O Código de Trânsito Brasileiro (CTB), em seu artigo 47, prevê que “nas áreas de estacionamento de veículos, a serem construídas ou já existentes, 5% (cinco por cento) do total de vagas deverão ser destinadas a veículos que transportem pessoas portadoras de deficiência física ou visual e os demais, de acordo com as especificações do CONTRAN”. Embora a redação original focasse em deficiência física e visual, a interpretação atual, à luz da Lei Berenice Piana e do Estatuto da Pessoa com Deficiência, abrange todas as deficiências, incluindo o autismo.

A Resolução nº 304/2008 do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN), que regulamenta a sinalização de vagas de estacionamento de veículos que transportam pessoas com deficiência e com dificuldade de locomoção, define que essas vagas devem ser sinalizadas com o Símbolo Internacional de Acesso. A utilização dessas vagas é condicionada à apresentação da credencial de estacionamento, que atesta a condição do usuário.

Quem tem direito e como comprovar

Conforme a legislação vigente, qualquer pessoa com Transtorno do Espectro Autista que se enquadre no conceito de pessoa com deficiência para fins legais tem direito à credencial de estacionamento especial. Não há restrição de grau de autismo ou de mobilidade física, uma vez que a dificuldade de locomoção ou a necessidade de maior espaço para embarque e desembarque podem ser decorrentes de desafios sensoriais, comportamentais ou de coordenação típicos do TEA.

Para obter a credencial de estacionamento, o processo geralmente envolve a apresentação da seguinte documentação aos órgãos de trânsito municipais (Secretarias de Trânsito ou DETRANs, a depender da localidade):

  • Laudo Médico: Um laudo médico detalhado, emitido por profissional habilitado (neurologista, psiquiatra infantil, neuropediatra), atestando o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA), com o Código Internacional de Doenças (CID). É importante que o laudo especifique a condição de deficiência para os efeitos legais.
  • Documento de Identidade e CPF: Do autista e, se for o caso, de seu responsável legal.
  • Comprovante de Residência: Atualizado.
  • Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (CIPTEA): Embora não seja um requisito universal para a credencial de estacionamento, possuir a CIPTEA (instituída pela Lei nº 13.977/2020) pode facilitar a comprovação da condição de autista e agilizar o processo em alguns municípios, já que ela é um documento oficial que atesta a deficiência para todos os fins.

A credencial é vinculada à pessoa com deficiência (autista), e não ao veículo, podendo ser utilizada em qualquer carro que o esteja transportando. Ela deve ser colocada em local visível no painel do veículo.

A carteira de identificação da pessoa com transtorno do espectro autista (ciptea)

A CIPTEA, criada pela Lei nº 13.977/2020, é um instrumento que visa facilitar a identificação da pessoa com TEA em todo o território nacional. Embora a credencial de estacionamento seja emitida por órgãos de trânsito específicos, a CIPTEA pode simplificar a comprovação da condição de autista para acesso a diversos direitos, incluindo o de vagas especiais. Ao apresentar a CIPTEA, a necessidade de outros documentos comprobatórios pode ser dispensada ou reduzida, agilizando o processo.

A fiscalização e as penalidades pelo uso indevido

O uso indevido das vagas especiais de estacionamento é uma infração de trânsito grave, prevista no artigo 181, inciso XX do CTB. A penalidade para quem estaciona nessas vagas sem a devida credencial é de multa (gravíssima), sete pontos na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e remoção do veículo.

Essa rigorosa fiscalização e as penalidades aplicadas visam garantir que essas vagas sejam utilizadas exclusivamente por quem delas realmente necessita, assegurando a acessibilidade e o respeito aos direitos das pessoas com deficiência. Cidadãos podem e devem denunciar o uso irregular dessas vagas aos órgãos de trânsito, contribuindo para a conscientização e o cumprimento da lei.

A importância da vaga especial para autistas

Para autistas, o acesso a vagas especiais de estacionamento vai além da mera comodidade. Muitas vezes, a dificuldade em lidar com ambientes ruidosos, aglomerados ou com muitos estímulos sensoriais torna a tarefa de estacionar e se deslocar de um estacionamento comum até o destino uma experiência extremamente estressante e desafiadora.

A vaga especial, por ser mais espaçosa e geralmente localizada próxima a entradas, permite um embarque e desembarque mais seguros e com menor exposição a estímulos adversos, minimizando crises sensoriais ou comportamentais e proporcionando maior tranquilidade e segurança para a pessoa com TEA e seus acompanhantes. É uma medida de acessibilidade que contribui diretamente para a participação plena e efetiva da pessoa com autismo na sociedade.

Desafios e a necessidade de conscientização

Apesar da previsão legal, a efetivação do direito a vagas de estacionamento especiais para autistas ainda enfrenta desafios. A falta de conhecimento por parte da população sobre a condição do autismo e o direito a essas vagas, a burocracia na emissão das credenciais em alguns locais e, em certas situações, a própria fiscalização deficiente, são obstáculos a serem superados.

A conscientização da sociedade sobre o autismo e a importância dessas vagas é crucial. Campanhas educativas e a disseminação de informações podem ajudar a reduzir o preconceito e a garantir que o direito seja respeitado.

Considerações finais

Sim, autistas têm direito a vagas de estacionamento especiais. Este é um direito assegurado pela legislação brasileira, que reconhece o Transtorno do Espectro Autista como deficiência para todos os efeitos legais. A Lei Berenice Piana, o Estatuto da Pessoa com Deficiência e as normas do Código de Trânsito Brasileiro formam o arcabouço jurídico que garante essa prerrogativa.

Para usufruir desse direito, é essencial que os autistas ou seus responsáveis obtenham a credencial de estacionamento junto aos órgãos de trânsito, mediante a apresentação do laudo médico. A utilização correta e o respeito às vagas especiais são atitudes que promovem a inclusão e o bem-estar das pessoas com TEA, contribuindo para uma sociedade mais acessível, justa e respeitosa.

Leave a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *